2005/04/05

Gosto mesmo deste filme: “Inherit the wind” (1960 e 1999) 

Ontem vi um grande filme. Aliás, vi um grande remake de um grande filme. Infelizmente, o canal de televisão que o transmitiu não o considera, uma vez que me obrigou a estar acordado até perto das 3 e meia da madrugada, durante um dia de semana, para ver um bom filme.
Não conheço o critério de escolha deste tipo de programação, apesar de o compreender até certo ponto. O horário nobre não está compatibilizado com conteúdos que nos obriguem a pensar. Daí as novelas, concursos apresentados por profissionais de talento duvidoso (aqueles que me dizem que esse tal de Malato tem talento para apresentar seja o que for na televisão, andam a tentar enfiar-me o barrete), filmes de fácil digestão (com uma ou outra excepção), tudo coisas escolhidas para que não cansemos muito a nossa cabecinha e possamos dormir descansados, uma vez que amanhã volta a ser dia de trabalho e de ocuparmos o nosso lugar na “linha de produção” para que o patrão fique contente... E mais abonado...

“Inherit the wind”, no seu título original, não é um filme de fácil digestão, apesar da sua compreensão ser relativamente acessível. Durante aproximadamente duas horas, é destilado perante nós um julgamento que decorre numa qualquer cidade sulista norte-americana durante meados dos anos 20, onde um jovem professor é acusado pelos fanáticos religiosos residentes de estar a tentar corromper a mente dos jovens e restantes cidadãos com supostas mentiras e idéias contrárias às palavras da Bíblia, tudo isto porque este professor resolveu cometer a heresia de falar aos seus alunos acerca dos estudos evolucionistas de Charles Darwin.
A história desenvolve-se assim naquilo a que se pode intitular um duelo entre os Agnósticos, defensores do jovem professor, e Fundamentalistas, que exigiam uma pena exemplar para este herético; focando as dúvidas e problemas teológicos das duas correntes de pensamento/crença.
O que torna este filme ainda mais interessante é o facto de sabermos que esta história é baseada em factos verídicos, ocorridos durante o ano de 1925. Condenar o ensino da evolução. Em pleno século XX. Mais nada!

Tive a sorte de já anteriormente ter assistido à versão original deste filme, realizada em 1960 por Stanley Kramer e com as magníficas interpretações de Spencer Tracy, Fredric March e Gene Kelly.
Agora sinto-me obrigado a aconselhar-vos a ver as duas versões uma vez que a que me foi dada a oportunidade de assistir na madrugada de ontem, é em si, coroada por excelentes desempenhos de ilustres como Jack Lemmon, George C. Scott (ao que sei, este foi o último filme em que participou antes de falecer), Beau Bridges, John Cullum e David Wells, entre outros. Esta versão mais recente é da responsabilidade de Daniel Petrie e foi realizada em 1999.

O argumento continua a cativar, uma vez que os diálogos são muito ricos em combustível para essa eterna discussão do Homem acerca da existência ou não do seu supostos Criador. Se acreditar, como acreditar e porquê acreditar? Mas outros aspectos são também abordados naqueles excelentes textos, contando que sejam lidas todas as entrelinhas, como a solidão, a grandeza, a humildade, a cegueira e o poder que nos é concedido a todos de alcançarmos a liberdade total através do nosso pensamento e do nosso almejado livre arbítrio.

Gosto mesmo deste filme e não tenho qualquer receio em aconselhá-lo a quem goste de excelente cinema ou mesmo a quem tenha problemas em aceitar e compreender idéias diferentes das suas.